Como outros filmes do diretor Todd Haynes, “Segredos de um Escândalo” (2023) leva o cotidiano para o terreno da estranheza. A capacidade do diretor de criar situações comuns e levar os atores ao limite do bom senso é notável e aqui ele encontra um terreno seguro para criar uma obra fascinante e incômoda na mesma proporção.
Não que a realidade fosse menos bizarra. O filme se inspirou a história real de uma professora que foi presa por abuso sexual ao ter um caso com um aluno de 13 anos. Na prisão, descobriu que estava grávida e após sair do cárcere, eles acabaram se casando e tendo outros filhos.
Aqui, Julianne Moore (hipnotizante) interpreta uma mulher que passou pela mesma situação e é obrigada a confrontar o passado quando uma atriz (Natalie Portman, no limite do histérico) chega na sua rotina para interpretá-la em um filme sobre o caso, acompanhando o dia a dia da família, provocando uma instabilidade emocional em todos.
Haynes estabelece uma atmosfera kitsch para sua construção estética, apelando para o melodrama e mise-en-cène exagerados, como um dramalhão mexicano, enfiando uma trilha sonora alta e repetitiva e movimentos de câmeras acelerados para momentos corriqueiros, como o abrir de uma geladeira.
É um incômodo rítmico e visual que exige uma cumplicidade grande do espectador, pois em alguns momentos realmente passam do ponto, como drama e exercício estilístico, o que pode afastar alguns
da proposta.
O que Haynes cria, para mim, é uma fábula surreal a partir de um cotidiano aparentemente pacato, de uma pequena cidade americana, mas que soa absolutamente delusional, onde gestos, falas e olhares transparecem sofrimentos, angústias e rancores. “Segredos de um Escândalo” recebeu uma merecida indicação de melhor roteiro original no Oscar, mas acho que Julianne Moore merecia também, pela dualidade e expressões exacerbadas que confere à sua personagem.
OSCAR 2024
E por falar em Oscar, nesta terça-feira (23), saiu a lista dos indicados com o óbvio favoritismo de “Oppenheimer” nas categorias principais, incluindo melhor filme, ator e direção. Infelizmente o melhor filme, “Assassinos da Lua das Flores”, deve levar apenas o de melhor atriz para Lily Gladstone e algum prêmio técnico de consolação (talvez montagem). Já Da’Vine Joy Randolph deve ficar com atriz coadjuvante por “Os Rejeitados”. De resto, ficou a surpresa pela esnobada da Academia em Greta Gerwig (que mesmo em um ano espetacular por ‘Barbie’, foi deixada para trás), Margot Robbie (a melhor coisa de ‘Barbie’) e Leonardo Di Caprio, que vinha bem nas apostas pelo filme do Scorsese.