Daniel Cravinhos foi condenado, junto com seu irmão Cristian Cravinhos e Suzane von Richthofen, pelo assassinato dos pais de Suzane, Manfred e Marísia von Richthofen, em 2002
Daniel Cravinhos foi condenado, junto com seu irmão Cristian Cravinhos e Suzane von Richthofen, pelo assassinato dos pais de Suzane, Manfred e Marísia von Richthofen, em 2002

“Hoje, serias capaz de me dar o abraço que não aconteceu 22 anos atrás?”, terminou a mensagem de Daniel Cravinhos em uma carta ao ex-cunhado, Andreas von Richthofen. Cravinhos foi um dos condenados pelo assassinato de Manfred e Marísia von Richthofen, pais de Andreas e Suzane.

Mais de 20 anos após o crime que chocou o Brasil, Daniel Cravinhos rompeu o silêncio. No texto, revelado pelo jornalista Ullisses Campbell no jornal O Globo, Daniel expressa arrependimento, pede perdão e diz viver atormentado pela culpa, com quem considera a maior vítima da tragédia.

Cravinhos vive em São Roque, no interior paulista, a apenas três quilômetros do sítio onde Andreas mora. Por ter medo de procurá-lo pessoalmente, enviou a carta por meio de um amigo em comum.

“Sinto vontade de tocar a sua campainha, mas morro de medo que você se sinta ameaçado com a minha presença”, escreveu o ex-cunhado.

Segundo Campbell, o intermediário chegou a tentar promover uma conversa entre os dois, mas Andreas teria passado mal ao ouvir a voz de Daniel durante uma ligação no viva-voz.

Reação de Andreas von Richthofen

A reação pública de Andreas veio pouco depois, em entrevista ao programa Tá na Hora, do SBT. Visivelmente abalado, ele foi categórico ao recusar o perdão. “Não vou servir chazinho para os caras, fica difícil. Marretaram a cabeça do seu pai e você vai dançar ciranda com o sujeito depois?”, afirmou.

Durante a conversa, Andreas também comentou sobre a irmã, Suzane von Richthofen, com quem tenta contato há quatro anos para resolver pendências financeiras, pendências envolvendo o patrimônio herdado dos pais, avaliado na época em quase R$ 10 milhões. “Ela deveria me procurar, né? Nós temos assuntos, ela tem o dinheiro dela também. Tem que ver o que vai dividir aí do que ficou lá atrás”, declarou.

Suzane foi libertada em janeiro de 2023, após cumprir mais de 20 anos de pena. Desde então, vive em Atibaia, no interior paulista, ao lado do marido, o médico Felipe Zecchini Muniz, e do filho, que nasceu em janeiro 2024.

Andreas, hoje com 36 anos, leva uma vida discreta em São Roque e enfrenta dificuldades financeiras. Ele responde a mais de 20 processos por dívidas de IPTU e condomínio que somam cerca de R$ 500 mil.

Carta de Daniel Cravinhos

“Querido Andreas,

Após sete anos de reflexão, finalmente encontro coragem para escrever a você. Sinto-me apreensivo com a sua possível reação ao ler essa carta. Recentemente, tomei conhecimento de notícias suas por meio de amigos em comum e pela imprensa, o que me levou a tomar a decisão de pôr para fora o que estou sentindo.

Minha mente está em turbilhão, pois meu desejo mais profundo é ter o seu perdão. As palavras mal conseguem expressar a intensidade de minha angústia e remorso. Minhas mãos tremem enquanto escrevo, e cada linha é uma batalha contra os fantasmas do passado.

Há duas décadas, desde aquele fatídico dia, carrego o peso do arrependimento e da culpa, ciente de que minhas ações trouxeram tamanha tragédia para nossas vidas. Desde sempre penso em você, a maior vítima de tudo o que aconteceu. Hoje, ao praticar motovelocidade, a imagem do seu rosto vem à minha mente. Como seria bom ter você ao meu lado, correndo em uma moto. Lembra do mobilete que construímos juntos?

Somos vizinhos em São Roque. Meu sítio fica a três quilômetros do seu. Sinto vontade de tocar a sua campainha, mas temo sua reação. Morro de medo que você se sinta ameaçado com a minha presença. Além disso, sei que a sociedade me vê unicamente como o assassino de seu pai. E você? Como você me enxerga além disso?

Saí da prisão em 2017 após perder 17 anos de minha liberdade. Mas você perdeu muito mais do que eu. Desejo compreender seu luto e fazer parte dele. Lembro do dia da reprodução simulada feita na sua casa duas semanas após o crime, quando você abraçou o Cristian e me olhou emocionado. Quando íamos nos abraçar, os policiais não deixaram. Entendi o seu gesto de carinho como um perdão. Contudo, você era apenas um adolescente. Hoje, você é um homem adulto. Gostaria de conversar contigo e expressar meus sentimentos.

Desde que saí da prisão, reconstruí minha vida, assim como Suzane, sua irmã. Aos trancos e barrancos, o Cristian também está tentando recomeçar. No entanto, a culpa continua a me perturbar. Parte de minha família me rejeita, e sinto que um dedo acusador aponta para mim constantemente, me lembrando do que fiz. Essa culpa não desaparecerá com a sentença que me condenou a 39 anos. Seguirá comigo até o fim dos meus dias.

Espero, do fundo de minha alma, que você encontre no coração a compaixão para me perdoar. Sei que minhas palavras podem parecer insuficientes diante da magnitude do que aconteceu, mas é com toda a sinceridade e humildade que peço por tua misericórdia. Estou disposto a enfrentar as consequências de meus atos e a fazer tudo o que estiver ao meu alcance para tentar reparar o enorme dano que lhe causei. Se você permitir, gostaria de ter a oportunidade de falar pessoalmente, olhos nos olhos, e abrir meu coração.

Mas, se você preferir manter distância, respeitarei. Apenas desejo saber o tamanho do abismo emocional que nos separa para saber se é possível atravessá-lo. Hoje, serias capaz de me dar o abraço que não aconteceu 22 anos atrás?

Daniel Cravinhos.”