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Chaves e Chapolin fora do ar até quando?

Depois de a plataforma Zapping anunciar "Chaves" em seu catálogo, o SBT contra-atacou e anunciou episódios do seriado que é um sucesso no Brasil em sua própria plataforma, o +SBT.
Personagens de Roberto Gómez Bolaños fazem sucesso em vários países. Foto: Divulgação

Ricardo Ferreira – Agência O Globo

Meio sem querer, querendo, há quase quatro anos as séries “Chaves” e “Chapolin Colorado” estão fora do ar no mundo todo. Fenômenos absolutos no Brasil, os programas não estão em canais de televisão, no streaming ou no YouTube desde julho de 2020. O motivo do “apagão”, termo usado pelos fãs, é uma queda de braço entre a Televisa (emissora mexicana que é dona das fitas dos episódios) e o Grupo Chespirito, comandado por Roberto Gómez Fernández, que detém os direitos autorais da obra. Fernández é um dos filhos do mexicano Roberto Gómez Bolaños (1929-2014), o Pequeno Shakespeare (daí o Chespirito), grande mente por trás do universo ficcional de personagens como Seu Madruga, Chiquinha e Quico, além de Chaves e Chapolin, interpretados pelo próprio Bolanõs.

Em entrevista ao Globo por videochamada, Roberto Gómez Fernández dá a entender que um desfecho para a arrastada negociação pode acontecer este ano.

“O que posso dizer é que estou nisso todos os dias e que não descansarei enquanto não acontecer. Se uma janela se fechar, buscarei outra”, afirma o empresário. “Sei que não é um caminho de linha reta. Mas é a maior responsabilidade que tenho, o retorno das séries originais. Não posso falar muito, mas há portas abertas. Me parece que 2024 será um ano muito bom”.

 

FLORINDA MEZA

Há uma figura que surge à margem nas tratativas: Florinda Meza, atriz que interpretava justamente Dona Florinda. Aos 75 anos, ela é viúva de Roberto Bolaños e ex-madrasta de Fernández. Em outubro do ano passado, ela se pronunciou com mais contundência, pela primeira vez, sobre o tal “apagão”. Em vídeo postado em suas redes sociais, disse que é “colaboradora literária dos programas” e que “um comprador já tentou por quatro vezes fazer a transação” em negociações para as quais ela não teria sido convidada. “Que tristeza. O público está esperando. O comprador também. Não fui eu que disse não”, afirmou.

O clima entre Florinda Meza e os seis filhos de Roberto Bolaños, frutos de seu primeiro casamento, é pesado há muito tempo. Bolaños se separou de Graciela Fernández, em 1977, para assumir um romance com a atriz que interpretava a personagem ranzinza, sempre às broncas com seus vizinhos. Roberto Fernández evita repercutir os comentários da atriz.

“Prefiro não falar, por vários motivos. Não há questões jurídicas envolvidas, mas é um tema que creio que não deveria falar em público”, explica.

Nem Florinda Meza nem representantes da Televisa responderam aos pedidos de entrevista do Globo.

 

DEMANDA

Fato é que o tempo passa e a base de fãs segue incrédula com o apagão. Há demanda – SBT e Multishow já manifestaram desejo de voltar a exibir os programas. Um dos administradores do Fórum Chaves, maior comunidade de fãs das séries, com quase 500 mil seguidores só no Instagram, o jornalista Antonio Purcino lembra que em agosto deste ano serão comemorados 40 anos da estreia de “Chaves” e “Chapolin” no Brasil.

“A gente espera com muita ansiedade que haja logo um acordo. Algo concreto, porque escutamos muitas promessas e não vemos nada acontecer. É muito difícil a gente ter acesso às séries. Desde antes de 2020, a Televisa vem derrubando qualquer conteúdo no YouTube. Ficamos dependentes de pirataria e do nosso acervo”, lamenta.

Para o dublador Gustavo Berriel – que, além de fã, é responsável pelas vozes de Nhonho e de Seu Barriga em parte dos episódios de “Chaves” – um final feliz passa mais pelas mãos da emissora mexicana.

“Sempre vi muita gente criticando a família pelo desacordo. Mas não vou muito para esse lado. Acho que a Televisa é a principal responsável. Acho que a emissora pode muito bem pagar o que as séries valem”.

Enquanto a negociação se arrasta, os fãs buscam outras formas de matar a saudade. Em São Paulo, o MIS Experience abriga desde 5 de janeiro “Chaves: a exposição”, maior mostra já feita em torno do universo de Bolaños. É um sucesso, já atraiu mais de cem mil visitantes e teve seu encerramento prolongado até 30 de março. Entre os diversos itens ao alcance do público, estão lá roteiros escritos por Bolaños, figurinos originais dos personagens e outros objetos raros. Fernández, que desde pequeno ia aos estúdios onde as séries eram gravadas, na companhia do pai, se emocionou quando viu a abertura da exposição em São Paulo.

“Creio que é a manifestação da obra e da pessoa de Roberto Gómez Bolaños mais rica que já vimos”, diz o executivo, saudoso do pai. “Ele era muito disciplinado. Isso significava estudo, concentração, ensaio e repetição. Numa época em que a comédia para a televisão, pelo menos aqui no México, era improvisação”.

São Paulo foi a primeira cidade a receber “Chaves: a exposição” e ainda não há previsão de que a mostra vá para outro lugar. Questionado sobre o porquê de a obra de seu pai ter dado tão certo no Brasil, Fernández reflete.

“Somos povos muito parecidos, temos idiossincrasias semelhantes. Uma atitude parecida em relação à vida, à gestão das emoções, ao dramático, mas também o apreço pelo humor e pela festa. A vila é um microcosmo cheio de contrastes. Acho que existem milhões de pessoas como Seu Madruga, por exemplo, no México e no Brasil. E obviamente eles se identificam”.

O herdeiro de Bolaños adianta que uma série biográfica sobre seu pai, para a HBO, está a caminho. Também há um documentário brasileiro sobre “Chaves” à vista, de Calvito Leal e José Francisco Tapajós. As gravações começam ainda neste semestre, conforme anunciou a coluna Play.

Antonio Purcino, do Fórum Chaves, consultor da mostra em São Paulo, opina, porém, que nada se compara as séries originais de “Chaves” e “Chapolin”.

“A marca continua forte, capaz de gerar audiência e consumo. É importante que haja novas produções. Mas nada substitui o produto original, clássico, que estamos acostumados a ver, com o talento de Roberto, de todo o grupo de atores e, no nosso caso, todo o grupo de dubladores”.